sexta-feira, 2 de agosto de 2013

A história que não contei quando o Padre Antonio deu a chance.


As mãos dizem muito sobre seus donos e podem revelar muitos segredos. Assim acontecia com as mãos do meu sogro, o Seu Antonio Tarossi, as mãos gigantes contavam para aqueles que amavam ele de verdade, uma aventura de vida cheia de heroísmo. 

Quando a gente olhava para as mãos grandonas dele pela primeira vez logo entendia que ele era um homem com história de trabalhos pesados, eram mãos brutas de um homem que com certeza tinha trabalhado na roça, que tinha carregado peso pesado, arado a terra,  trabalhado duro na colheita e caso você amasse ele de verdade, iria concluir que ele era um domador de cavalos em Corumbatai.  Ouvi dizer que pessoas que trabalham duro assim, ficam com as mãos gigantonas e que, de vez em quando, as mãos parecem até ter vida própria. 

Um dia, as mãos do Seu Antonio ficaram cansadas de domar  burros e  cavalos e resolveram resolveram vir para São Paulo . Foram trabalhar carregando bandejas em restaurantes para servir senhores e senhoras muito distintas em vários restaurantes, buffets, banquetes, recepções e festas. As mãos do Seu Antonio gostavam muito de um baile  e  quando possível iam dançar em salões de pessoas de respeito usando sempre um lenço em uma das mãos quando dançava com alguma senhorita.  

Quem conhecia as mãos dele de verdade, sabia que elas adoravam servir as pessoas chiques, e, quanto mais chiques melhor. As mãozonas brutas foram aprendendo a servir com delicadeza, adorando quando alguma madame chique se dava mal depois de tratar alguém com descaso e adorando mais ainda quando a  gorjeta era boa. 

 Diz o folclore que,  quando as mãozonas  não gostavam do cliente eram loucas para errar na cobrança, adicionando incidentalmente o número da mesa no total da conta. Era a esperteza das mãos brasileiras falando mais forte do que tudo. 

Um dia as mãozonas do Seu Antonio conheceram as mãos faladoras e trabalhadoras da Dona Janette e logo estavam casadas. 

Foi  cara a aliançona que o Seu Antonio teve que comprar para caber no dedo grandão. Foram tempos de muita dificuldade  mas de realizações e crescimento.

Então as mãozonas tiveram que trabalhar ainda mais duro. Trabalhavam em dois, três e quatro ou mais empregos quando conseguia e nunca, jamais  descansavam. 

As mãos eram trabalhadoras e quanto mais trabalhavam maiores ficavam. Foram tantas as bandejas, tantos os banquetes e recepções que acho que as mãozonas estavam ficando maiores que um mamão.
Não pense você, que lê esta aventura, que as mãos sempre foram grandotonas. Quando eram crianças, as mãos eram pequeninas. Naquele tempo a Dona Anna Friatskovisky, que era da Hungria e também tinha mãozonas grandotas, batia com elas na cabecinha do Seu Antonio menininho e pedia para que fosse ajudar na roça, então, foi assim que tudo começou, carregavam uma coisinha aqui e outra ali, ficando mais fortes e maiores a cada dia que passava.


Acho que o pai dele, o Seu  Gildo, que era um amor de pessoa, mas do clã das mãos normais, muito boazinhas e  que gostavam muito de pirogue. Desde pequeno  as mãos dele acompanhavam  de perto as mãos do seu pai trabalhando e aprenderam com o exemplo  a serem guerreiras e lutadoras  e que o  trabalho engrandece as mãos.

As mãos do Seu Antonio  com as da Dona Janette tiveram 4 filhas com mãozinhas (menos uma que as mãos eram um pouco grandes). Queriam ter um filho com mãozonas, mas Deus não deixou.  

Ele educou suas filhas com mãos firmes e que apesar de calejadas e ásperas como uma lixa de madeira,  ficavam lisas  quando estava com elas.

Enquanto teve suas filhas aconteceu um dos grandes amores das mãozonas dele: a Pirelli. Protagonista de muitas aventuras na vida das mãos do Seu Antonio, esta foi motivo de orgulho e admiração. 

Nessa empresa, as mãos dele foram crescendo de cozinheiro a gerente de restaurante. Acho que as mãos não entendiam direito o valor de mãozonas caipiras terem enfrentado todas as dificuldades e terem conseguido alcançar um cargo tão alto sem muito estudo em uma organização tão grande e povoada por vários italianos, desembargadores, superintendentes, engenheiros, advogados, e  Super  Homens, Capitães América, entre outros  que elas tanto idolatravam. 

A verdade, que as mãos  do Seu Antonio  não sabiam, era que esses homens com tanto estudo,  arrogância  e soberbia , não valiam o dedinho  gigante de uma só mão  dele. 

O primeiro apertão de mão que recebi do Seu Antonio foi uma sensação inesquecível, na verdade eu acho que foi um abraço de mão. Primeiro gostei das mãos da Regina  - bem maiores que as minhas -   e, depois que eu o conheci, gostei também muito das aventuras que as mãos dele contavam. 

Acompanhei as mãos dele levarem minha esposa para o altar, depois as  Helena e o Hailton e depois as  Cristina com o Ivan. As da Ana não  foram levadas, mas não por culpa delas. 

As mãozonas do Seu Antonio gostavam de jogar tranca com a gente, mas tinha que ficar de olhos abertos, pois as cartas eram louquinhas para passear entre aqueles dedões.

 Uma das partes mais  emocionantes dessa aventura começa agora, preparem seus corações pois vou contar como e que as mãozonas faziam com a netaiada. 

Cada neto que foi chegando foi fazendo aquelas mãozonas mais bobas, mais lindas, mais de vô  e mais legais. Com a Bruna elas pararam de beber, mas depois voltaram. Foram crianças novamente, brincavam, provocavam, viviam fantasias. O Pedro chegou para que a bebida fosse banida definitivamente da vida delas. Voltaram a falar, a ser mãozonas crianças novamente, reaprenderam a ver o mundo com olhos sem censura, a rir de coisas simples.  

Chegaram a Halana e a Heloísa e elas ja sentem o peso da idade e de que para  dar conta de 4 netos precisam da ajuda das mãozinhas da Jane.

E então chegam umas mãozinhas machinhas do Leonardo e do Murilo, que parecem fazer reascender a força vital das mãozonas vovozinhas que voltam a brincar como se o tempo tivesse voltado atrás e rejuvenescido o mundo.

Cada um de nós teve o amor daquelas mãozonas brutas. Fossem elas mau humoradas, ranzinzas, faladoras, bravas,  tossidoras , faladoras, fumadoras,  ....não importa como fossem elas nos amavam de um jeito acho que as vezes um pouco tosco, mas de forma legitima. 

Tenho certeza que as mãos dele morriam de ciúmes quando o Seu Antonio pedia  para a Regina fazer massagem nos pés dele, mas também tenho certeza de que logo passava, pois eram elas , as mão que protagonizavam e controlavam toda a situação , apertando, abraçando e falando, isso mesmo, contanto muitas histórias. 

Com o tempo as mãos do Seu Antonio eram como uma extensão das mãos do meu pai. Eram mãos de respeito e de sabedoria, mãos de carinho e zelo. 

 A mãos da minha esposa, que também são um pouquinho grandotas  (é a segunda vez que falo isso) , contaram que por muitas vezes as mãos do Seu Pai ficavam esperando que elas passassem lá na casa delas para almoçar depois das aulas, e que isso era um sinal de amor tão grande, tão enorme,  tão gigante,  que eu acho que comparados com as mãos dele, ficavam parecendo mini mãos.


Vi as mãos  fortes e lutadoras do Seu Antonio perderem vagarosamente o vigor, vi com  a  dor de um filho a dignidade escapando pelos seus dedos, mas o amor que elas sentiam por nós nunca diminuiu.

Vi as mãos do Seu Antonio pela ultima vez no hospital  na última sexta-feira  A vida delas já estava fraquinha, mas elas me disseram com um sorriso enorme de alegria: - Você veio?! Você conseguiu chegar?! 

Respondi que sim e contei para ele de um curso que minhas mãos fizeram com mãos americanas, mas acho que elas não conseguiam prestar atenção em outra coisa que não fossem meus olhos, dizendo sem nenhuma palavra ou gesto o quanto eu era amado.

Depois de algum tempo, segurei a vontade de chorar, abracei o Seu Antonio e falei para ele que o amava muito e que ele era como um pai para mim. Beijei a careca dele e me despedi.  Ele estranhou um pouco, mas foi minha ultima lembrança daquelas mãozonas vivas.

As mãos falam muito sobre que a pessoa, tenho certeza que, de vez em quando, quando as mãozonas do Seu Antonio puderem e Jesus deixar,  virão  aqui segurar as mãos de cada um de nós para nos orientar e nos fazer lembrar de suas looongas aventuras.

Escrevo isso em homenagem a um homem que venceu uma quantidade infinita de dificuldades  e mostrou como é importante lutarmos pela vida e que  para mim foi o maior e mais respeitado superintendente  da Pirelli ou de qualquer outra empresa do mundo  que já mais  existiu.

Saudades!


Escrito por Cássio Roberto Brigide,
 logo após o falecimento de seu sogro: Sr. Antonio Tarossi. 


Um comentário:

  1. Cássio meu filho, você me fez chorar, talvez de alegria , primeiro por ser uma pessoa tão humana e amar muito todos os seus .
    Contar uma história de vida com tanto amor e carinho é ter mãos gigantes, é viver uma vida inteira voltada para Deus.
    Sei também que seu sorriso, seu choro apertado dizem o quanto você conviveu com seu sogro e quanto carinho ao ficar ouvindo
    todas essas façanhas da vida dele. Sei também que cada pequena ajuda que você oferece é de coração aberto e cura um coração
    machucado pois seu amor é verdadeiro. Quero dizer-lhe mais uma vez(embora vc já saiba) que o amamos muito.
    O seu Antonio, lá do céu está te abençoando com suas mãos grandonas cheio de amor pra dar.
    Acho também que o papai está feliz ao receber seu Antonio apertando suas mãos. Que Deus te abençoe.
    Bel

    ResponderExcluir

Seu comentário será postado após 1 hora.